
Fabião Hermenegildo Ferreira da Rocha,
popularmente conhecido por Fabião das Queimadas nasceu em 1848, na fazenda
Queimadas município de Lagoa de Velhos.
O
folclorista Câmara Cascudo, no seu livro "Vaqueiros e Cantadores", descreve-lhe
o tipo físico do poeta. Ele era um negro baixo, entroncado, robusto, de larga
cara "apratada" e risonha, nariz de congolês.
Tinha
os olhos tristes de escravo, conservava a dentadura intacta e um bom - humor
perene.
Nascido
escravo, o notável poeta pertenceu ao major José Ferreira da Rocha, nas
Queimadas das férteis terras de Lagoa de Velhos. Fabião, começou a vida como
agricultor e vaqueiro.
Há
uma grande suspeita de que o poeta é filho de José Ferreira com uma escrava.
Porém, foi encontrado pelo pesquisador Hugo Tavares Dutra na Arquidiocese de
Natal, a certidão de casamento de Fabião datada de 17 de novembro de 1881, na
qual consta que este era filho de um escravo chamado Vicente. Mesmo assim, a
possibilidade do poeta ser filho de José Ferreira não está descartada.
Com
dez anos o poeta já cantava. Aos dezoito anos de idade, o poeta não se conteve
e com algumas economias que fez no trabalho da agricultura, juntando dinheiro
vendendo couro de animais, mel, legumes e frutas que plantava conseguiu comprar uma rabeca, sendo que essa rabeca passava a ser um instrumento não musical, mas com
ela saiu cantando e tocando suas toadas e seus repentes pelas vaquejadas, pelas
casas e povoados simples de sua região. Note o amor com que o poeta dedica esta
redondilha ao seu instrumento:
"Essa minha rabequinha
É meus pés e minhas mãos
É meu roçado me mio
Minha pranta de feijão
Minha criação de gado
Minha safra de algodão."
Com
esse propósito o poeta conseguiu ganhar dinheiro o suficiente para comprar a
sua própria liberdade por 800$000 (oitocentos mil réis) e posteriormente a de
sua mãe Antônia por 100$000, e de uma sobrinha, Joaquina Ferreira da Silva por
400$000, conhecida como "Sinhaninha" com a qual o poeta casou e
tiveram quinze filhos.
"Quando forrei minha mãe
A lua saiu mais cedo
Pra clarear o caminho
De quem deixava o
degredo"
Ao
dizer "forrei" o poeta faz uma referência à compra da carta de alforria de sua mãe com o
dinheiro que ganhava tocando rabeca.
Considerado
o primeiro rabequeiro de que se tem notícia no Rio Grande do Norte, Fabião era figura
conhecida no interior do Estado, Fabião das Queimadas não era cantador de
feiras, cantava na casa dos amigos e dos ricos, com ou sem remuneração alguma.
Tinha
verdadeira paixão pelas vaquejadas, era uma espécie de repórter, gostava de acompanhar
os vaqueiros na captura de um barbatão e assistia a uma vaquejada observando
atentamente todos os lances para melhor se inspirar nos seus bonitos versos.
Sabia contar todos os acidentes
ocorridos e, como era bom poeta e cantador, encarnava-se no cavalo ou na rês.
Além dos chamados romances da literatura de cordel, também gostava de fazer
trovas de improviso. Usava habitualmente um inseparável chapéu de couro,
símbolo do vaqueiro nordestino.
Fabião
tinha uma verdadeira admiração pelo famoso cavalo Castanho da fazenda Divisão,
encravada no município de São Paulo do Potengi. Contam que, ao saber da morte
do "Castanho da Divisão", encarnou-se no animal e disse de improviso
a seguinte trova:
"Gostei de correr o gado
Quando eu tinha boa esteira.
Novilha, boi, vaca e touro
Pra mim não tinham carreira".
Conta
Sátiro Adelino Dantas que,nos idos de 1920, o poeta do Potengi resolveu fazer
uma visita ao coronel José Bezerra de Araújo Galvão, o todo-poderoso coronel Zé
Bezerra da Aba da Serra.
O coronel não se encontrava em Currais Novos. Estava invernando na famosa fazenda
Aba da Serra. Fabião não perdeu tempo. Viajou imediatamente até o solar do
velho patriarca do Seridó.
Lá
chegando, foi recebido fidalgamente pelo coronel e seus familiares. Conversa
vai, conversa vem, lá pras tantas um amigo do coronel solicitou ao poeta fazer
um elogio em versos ao coronel José Bezerra.
Fabião, então, improvisou a seguinte sextilha:
"Aqui na Aba da Serra
Não é pra ninguém subir.
Só se fôr de Currais Novos,
Ou então do Acari,
Ou Fabião das Queimadas,
Poeta do Potengi."
Câmara
Cascudo convidou o poeta para fazer um passeio. Através do folclorista, o poeta
conheceu muita gente importante da capital e no interior. Pessoas como o
governador Ferreira Chaves e Eloi de Souza. Este último, grande admirador da
inteligência e dos versos inspirados do poeta popular. Eloy providenciou que
fosse tirada uma foto do poeta, que hoje é sua única foto conhecida. O poeta
dos vaqueiros foi estudado por Ariano Suassuna e Orígenes Lessa, além de ter
sido musicado por Antônio Nóbrega.
Em
1910, Alberto Maranhão (1872 - 1944) era governador do Rio Grande do Norte e
estava invernando na sua fazenda Cachoeira, localizada no atual município de
São Paulo do Potengi. 0 governador era um homem enamorado da poesia. O poeta
chegou a cantar até no Palácio do Governo. Fabião era quase vizinho do Alberto Maranhão,
pois sua pequena propriedade Riacho Fundo ficava a poucos quilômetros da
fazenda Cachoeira.
Certo
dia, Fabião das Queimadas apareceu para fazer uma visita a Alberto Maranhão. 0
anfitrião solicitou a Fabião que cantasse alguns romances sertanejos. 0 poeta
atendeu de imediato a solicitação do governador. Acompanhando-se da sua famosa rabeca,
cantou alguns romances. Depois, passou a declamar quadrinhas.
Outra
vez, também na residência oficial do Governador, saudou com esta quadra o
Senador Elói de Sousa, um dos grandes vultos da política de então, o qual não
se envergonhava do sangue negro que lhe corria nas veias:
"Seu doutô Elói de Sousa,
Minha mãe sempre dizia,
Se o senhô não fosse rico,
Era da nossa famia."
Fabião
tinha muita estima por seus filhos. Filipe Ferreira da Silva, ou Filipe Fabião,
e Fabião Filho, ou Fabião Novo. O primeiro dedicou-se desde muito moço ao trato
com a terra. O segundo era o caçula da família. Fabião Filho era um menino
vivo, inteligente e despontava alguma vocação poética O velho Fabião tinha
esperança de que o seu caçula fosse um dia o seu substituto na arte da poesia.
Tanto que uma vez fez a seguinte trova:
"Eu sou o Fabião véio,
Divertimento do povo;
Morrendo Fabião véio,
Vai ficá Fabião novo."
Para
decepção do velho poeta. Fabião Filho começou a apresentar sintomas de loucura,
doença que progredia cada vez mais. Doente e acabado, esperando a visita da
morte a qualquer momento, Fabião das Queimadas fez o seu último verso em
sextilha, cujo teor é o
seguinte:
"Quando ouvirem falá
Que Fabião véio morreu,
Todos pode acreditá
Que a semente se perdeu:
De muitos fio que tive
Nenhum saiu que nem eu".
Fabião das Queimadas morreu aos 80 anos de idade,
em 1928, na sua pequena propriedade chamada Riacho Fundo em Barcelona vitimado
pelo tétano quando se feriu num espinho de macambira quando viajava montado em
um burro. O poeta está enterrado no cemitério local de Barcelona.
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