Nas ribeiras do
Potengi já passa de uma semana sem sinal de chuvas num mês que vai terminando
fraco delas. Vê-se o mato murchando e o pasto ficando ralo, o céu azul infinito quase despovoado de
nuvens. Barra no poente, nenhuma. Na nascente, também não. Mas os
meteorologistas que andaram reunidos em Sergipe, terra de Francisco J.C.
Dantas, do time dos grandes escritores brasileiros, e criador de cabras e
carneiros em sua fazenda Lajes Velha, acreditam que as chuvas voltarão ao leste do Nordeste em junho e julho
respingando nos agrestes, amém. Esperanças renovadas, com as quais saúdo as
jitiranas que ensaiam de roxo os caminhos daquele chão. As chuvas falharam e
suas ramas não conseguem subir pelas estacas, se espichar pelo arame e
abraçar as juremas e catingueiras. As jitiranas, todos os anos, por estes
tempos de maio e junho fazem a festa pelo Potengi. Foram até homenageadas com
um soneto de Virgílio Maia, poeta maior das ribeiras do Jaguaribe:
Cessada a chuva, à jitirana em festa/ doideja cores pelo Potengi,/ nos caminhos de sempre, onde sorri/ nesse tom-sobre-tom do violeta. // Depois, acolá assim, as catingueiras/ são moedeiros dos dobrões mais puros,/ expostos à cobiça e demais usos/ do esvoaçante mundo das abelhas. // A arquitetura vegetal se exibe:/ cerca de arame faz muralha verde,/ salpicada do roxo da Quaresma. // Eis na latada um beija-flor a pique / é furta-cor exclamação de sede/ no sufragante de uma cena acessa.
Mesmo sem sinal de chuva, domingo foi de muita alegria em Queimada de Baixo. Estava dividindo um flerte entre a jitiriana driblando os espinhos de um facheiro com sua florzinha ainda de roxo desmaiado e o amarelo ouro de uma caibreira que antecipou o tempo de sua floração, quando de repente, mais do que de repente, vejo entrar pelo terreiro o velho amigo Ambrósio Azevedo, patriarca de São Paulo do Potengi, à frente de sua comitiva: Amauri de Ambrósio, Pedrinho Aquino, Luizinho Marques e Johan Adonis, conhecido e respeitado como o maior degustador (não bebedor) de cachaça daquelas ribeiras. Também é geógrafo e tem paixão pelo ABC e pelo PT. Muito mais pelo PT.
Amauri é músico e formado em gestão pública Pedrinho Aquino, empresário
comercial, e Luizinho, livreiro e dono da principal banca de jornais de São
Paulo. Todos, discípulos do Monsenhor Expedito e que prosseguem na mesma
missão com o Padre Ramos. Pedrinho é tão devoto que o seu estabelecimento
comercial (material de construção) tem o nome de Frei Damião. Na sua calçada, quando a feira era no
domingo, reunia-se, todas as manhãs, uma confraria da qual fazia parte também o
doutor Otávio Lamartine. Ambrósio, já chegando aos 85 anos, é a memória viva de
São Paulo do Potengi. Foi comerciante, dono de padaria, dono de cinema, dono de
amplificadora, comentarista politico, vereador e assessor do Monsenhor Expedito
para assuntos variados.
O papo se instalou no alpendre que se abre para a nascente dominada pela Serra de Joana Gomes. Foi uma manhã, entrando pela tarde, agradabilíssima e de de tanto encantamento que, ás vezes, quando a roda fazia uma rápida pausa para beliscar o cálice de vinho do Porto ou uma cachacinha de Salinas (preferida do Johan, que não é irlandês, mas nascido em São Tomé, com antepassados seridoenses), tinha-se a sensação de ouvir, não muito distante, os aboios de Fabião. As Queimadas estavam em festa.
Fonte: Coluna do Woden Madruga / Tribuna do Norte
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